sexta-feira, janeiro 03, 2014

As sociedades negras, por Antônio Carlos Côrtes

Fui citado pelo eminente advogado e radialista Dr. Antônio Carlos Côrtes em seu artigo "As sociedades negras", publicado no Jornal do Comércio, no dia 30.12.2013, o que muito me honra. O Dr. Côrtes só exagerou ao falar que eu ensino. Na verdade, só repassei um conhecimento que me foi fornecido pelos nossos Mais Velhos. Quem tiver o desejo de conferir, aí vai o link do artigo. Obrigado, Dr Côrtes.


As sociedades negras


Antônio Carlos Côrtes

“O 13 de maio nada representa para a raça negra” (Alceu Collares, no livro Nós, os afro-gaúchos). A Sociedade Floresta Aurora foi fundada em 31 de dezembro de 1872 por negros que lutaram e conquistaram alforria, daí a expressão “forros”. Seu caráter beneficente foi causa primeira. Ajudar famílias negras a pagar enterros dos parentes bem como prestar assistência material, moral e espiritual. Os sócios, na maioria operários, eram moradores nos bairros Menino Deus, Bom Fim e Rio Branco. O jornal A Federação registra que em 1918 o nome oficial era Sociedade de Dança e Beneficência Floresta Aurora. Em 25 de setembro de 1961, alterou o nome para Sociedade Beneficente Cultural Floresta Aurora. Presentemente, ao completar 141 anos, é proprietária de aprazível sede na estrada Afonso Lourenço Mariante, 437/489, no bairro Belém Velho em Porto Alegre. É a sociedade negra mais antiga do Estado. É exemplo que os clubes sociais negros são lugares de memória, resistência na preservação, apreciação e valorização da cultura. 

Espaços culturais no compasso dos sons, na métrica dos saberes para as sociedades negras. Lembrando Gilberto Gil: a Bahia já me deu régua e compasso. Logo, posso medir meus passos em laços que abraçam todas as sociedades negras. Se o RS possui mais de 50 clubes sociais negros, ninguém tem dúvida. Lugares, memórias, resistências são patrimônio imaterial comportando desde logo análise, eis que, via de regra, estão ativos e presentes. A existência da Floresta Aurora é o reconhecimento do valor cultural do bem, que transforma em patrimônio imaterial a cultura negra. 

O jornalista Gerson Brisolara ensina: os índios do Xingu dizem que nos troncos de árvores moram, encantados e perpetuados, os espíritos de seus ancestrais. Quando o terreiro de batuque ou candomblé é criado, planta-se no solo o axé da casa, que perpetuará naquele local o acúmulo de saberes que a ancestralidade proporciona à comunidade. Negros e índios sabem que a experiência está fincada em certos locais, sacralizados pelo que foi vivido ali.  

Abater clubes negros, sociedades e escolas de samba é, portanto, matar o axé, derrubar os troncos das árvores sagradas, é quebrar o elo de ancestralidade que faz a vida em comunidade ser possível. A longevidade da Sociedade Floresta Aurora é a prova de que a luta para preservar sociedades negras é possível.

Advogado