sexta-feira, setembro 09, 2022

Comemorações: Sesquicentenário, 500 anos do Descobrimento e Bicentenário da Independência

Frustrante. É a palavra para definir a comemoração de uma data tão marcante quanto os 200 anos da Independência do Brasil. O dia 7 de Setembro de 2022 foi mais do mesmo. Pela manhã, desfiles cívico-militares e as tradicionais passeatas do Grito dos Excluídos.

À tarde, as ruas de algumas das principais capitais se tornaram palanques para candidatos à Presidência da República. A orla de Copacabana foi tomada por admiradores do presidente Bolsonaro, que transformou um suposto evento militar em comemoração ao bicentenário em um comício. 

Eu tinha apenas 2 anos de idade quando foi comemorado o Sesquicentenário da Independência do Brasil, em 1972. O país vivia os anos de chumbo, sob a presiência do general Emílio Médici. Mas houve uma bela programação sobre os 150 anos da Independência, com a realização de seminários, lançamento de livros e até um minitorneio de futebol entre entre seleções, cuja final foi entre Brasil X Portugal, disputada no estádio do Maracanã. Jairzinho, o "Furacão da Copa de 70", marcou o gol que selou a vitória sobre nossos patrícios.

Jairzinho marca o gol da vitória da Seleção na final da Taça Independência

No ano 2000 foi a vez dos 500 anos do Descobrimento do Brasil. A comemoração foi um tanto polêmica e controversa. O Brasil vivia sob o segundo governo de Fernando Henrique Cardoso. No dia 22 de abril de 2000, foram lembrados em manifestações artísticas em todos os estados, mas os festejos oficiais na Bahia redundaram em fracasso.

A grande festa preparada pelo governo em Porto Seguro, local do desembarque dos primeiros portugueses, foi prejudicada pelo confronto entre manifestantes e policiais militares. Muitos eventos programados foram cancelados.

O símbolo maior da comemoração — uma réplica das caravelas cabralinas — literalmente naufragou. A embarcação, que custara R$ 500 mil (mil reais para cada ano de História), não conseguiu zarpar de Salvador rumo a Porto Seguro. E ainda hoje, continua adernada, próxima ao porto de Vila Velha, no Espírito Santo.

Os confrontos envolveram índios pataxós, sem-terras e militantes políticos que anunciaram uma marcha para denunciar desigualdades. Nada de grave ocorreu enquanto parecia apenas um ato pacífico. Porém, quando os manifestantes se aproximaram mais do local onde estavam as autoridades, a PM da Bahia entrou em cena para dispersar a marcha. Bombas de gás lacrimogêneo, pedradas e até o disparo de flechas pioraram a situação, fazendo com que a festa tivesse uma repercussão vexatória, inclusive no exterior.

Nesta época, eu trabalhava em dois veículos de comunicação: era repórter da editoria de Geral do Jornal do Comércio, no turno da tarde, e pela manhã, era produtor/redator na Rádio Bandeirantes, que na época transmitia a mesma programação nos sinais AM e FM.


Parte da galera que trabalhava na Band RS (rádio e TV) em 1999/2000.

O mês de abril se aproximava e a Band RS não havia se manifestado em fazer algum programa ou programação sobre os 500 Anos do Descobrimento. Uma bela manhã em um sábado de plantão na rádio tive a ideia de oferecer à direção de jornalismo da emissora uma série de cinco programas para serem transmitidos em cinco dias (entre 17 a 21 de abril) na semana dos 500 anos. E era uma semana rica pois abrangeria o dia do índio e o feriado de Tiradentes. O 22 de abril, consagrado como data oficial do Descobrimento, naquele ano caiu num sábado.

Jornalistas, técnico-administrativos e equipe técnica reunida (+/- 1999)

Imaginei os programas como paineis de um grande seminário, dividido em cinco tópicos: mulheres, negros, povos indígenas, imigrantes e excluídos. O nome da série eu mesmo escolhi: Brasil, 500 Anos - Que História é Essa? 

Os programas foram ao ar das 14 horas às 15h30, com apresentação do jornalista Felipe Vieira e foram divididos assim:

17/04 - Mulher Brasileira em Primeiro Lugar

18/04 - Black is Beautiful - O Negro é Lindo

19/04 - Índios, os Donos da Terra

20/04 - Brasil, Berço dos Imigrantes

21/04 - Terra de Todos ou Pátria de Ninguém?

A brincadeira, à época, é que eu queria fazer um programa que não tivesse a participação dos jornalistas Eduardo Bueno e Walter Galvani, que lançaram livros alusivos à data naquele ano e eram os campeões em concederem entrevistas aos meios de comunicação.

A série "Que História é Essa?" teve apresentação do jornalista Felipe Vieira.

No dia da mulher conseguimos levar, entre outras convidadas, Ieda Maria Vargas, Miss Universo. Convidei uma socióloga da Ufrgs para dar um viés científico mas a mulher se inibiu, não falou nem 5 minutos e permaneceu calada o resto do tempo.

No dia do Índio, conseguimos que o líder indígena Ailton Krenak entrasse por telefone. No dia dos negros reunimos lideranças políticas, ativistas e intelectuais para falarmos sobre a causa. Para o dia dos imigrantes reunimos representações alemãs, italianas, árabes, portuguesas, judias e japonesas.

O dia mais fraco foi o último. Tentamos falar sobre excluídos em um feriado chuvoso e dois dos seis convidados não apareceram. Até o Felipe não foi, sendo substituído pelo João Garcia. Compareceram um ativista da causa LGBTQIA+, uma profissional do sexo, um egresso do sistema penitenciário e um representante da terceira idade (na verdade, um animador de festas para idosos). Os outros convidados, ao tomarem conhecimento de que iriam dividir a bancada com os representantes anteriormente mencionados se negaram a comparecer. Não lembro exatamente os segmentos, mas eu acho que eram representantes de  aposentados e sem-teto ou sem-terra. 

Foi trabalhoso, mas foi gratificante fazer e produzir a série dos programas. Daria para ter feito muita coisa legal neste bicentenário da Independência. Infelizmente, a emissora é outra, o tipo de fazer jornalismo é outro, o Brasil é outro.



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